A arte de conversar
Clotilde Tavares | 11 de agosto de 2009Nos dias de hoje, existe uma febre de aprender que toma conta de todas as pessoas, principalmente aquele tipo de conhecimento que a gente não sabe direito se precisa dele mas mesmo assim vai atrás. Os livros que começam por “Como fazer…” enchem as estantes das livrarias, desde o pioneiro “Como fazer amigos e influenciar pessoas”, de Dale Carnegie, passando por coisas práticas do tipo “Como resolver o problema de insônia do seu filho”, “Como se faz uma tese”, “Como lucrar na crise”, e chegando a títulos mais sugestivos: “Como se dar bem com as mulheres”, “Como desmanchar feitiços” ou “Como falar com seu anjo”.
Entre tantas coisas que as pessoas podem aprender a fazer, eu quero sugerir algo que, nos últimos trinta anos, parece que se desaprendeu um pouco: conversar. Isso mesmo, conversar, bater papo, dialogar. A conversação é uma arte, que se aprende, se pratica, se desenvolve como dom. Conversar é como jogar tênis, porque os conversadores hábeis, os bons de papo, fazem o possível para manter a bola no ar, sem deixá-la cair no chão do silêncio, da falta de assunto ou do monopólio da palavra.
As pessoas, principalmente os mais jovens, não sabem mais conversar porque não sabem escutar, uma vez que a arte de conversar inclui também os momentos de escutar o que o outro diz. Hoje, interrompem sem necessidade, não prestam atenção ao rumo da conversa, se irritam, esbravejam e tentam impor suas opiniões.
Montaigne, no capítulo VIII do Livro III dos “Ensaios” diz que a conversação é o mais proveitoso e natural exercício do espírito. Mas é preciso, para usufruir das benesses de uma boa conversa, estar atento para alguns detalhes. É importante discutir as coisas no plano do universal, sem puxar para o particular.
Por exemplo: a discussão sobre as vantagens e desvantagens do casamento pode ser interessante, mas começar a esmiuçar os detalhes do casamento da vizinha transforma a conversa em fofoca. E só podemos conversar se houver diferença de opiniões. Se todo mundo estiver de acordo não há necessidade de falar: basta ficar em silêncio e comungar espiritualmente com quem esteja do seu lado, uma vez que não há opiniões para serem confrontadas.
Para quem tiver interesse, recomendo três livros: “A Arte da Conversação”, de Peter Burke (UNESP); “A arte de conversar”, de Alcir Pecora (Martins Fontes), e “A Arte de Conversar”, de James A. Morris Jr. (Record). No mais, é praticar essa arte cujas regras de ouro são: não monopolizar, não interromper, não teimar, não tentar impor seu pensamento. Você vai ver como é bom.
Morais? É você? Com esse nome de antonio e esse nick cioram penso que é você. se for, seja muitíssimo bem vindo. Se não for, sinta-se muitíssimo bem-vindo também, afinal, o nick cioram não é pra todo mundo, só para gente especial.
O artigo é muito oportuno. A bibliografia citada e sugerida é ótima.
Apenas para conversar, quero lembrar que uma das fortes razões dessa incapacidade para a conversa é o egocentrismo desvairado que parece, mais do que nunca, tomar conta do mundo. Para o egocêntrico, o mundo termina na ponta do nariz dele. O outro é apenas um penico (quando muito). Conheço um sujeito que diz, literalmente: “Para eu conversar, basta-me alguém ao lado, de preferência calado. Não me interessa o que ele fale; nem mesmo se está entendendo o que digo; basta que me escute.”
A comparação com o tênis não é boa; boa seria com o frescobol: neste, sim, os participantes fazem tudo para devolver a bola da melhor maneira possível, pois os dois jogadores não são concorrentes: convergem no mesmo desejo: não deixar a bola cair.
(Apenas para não parecer que me aproprio da idéia do outro, está em Rubem Alves a comparação entre o tênis e o frescobol.)